segunda-feira, 24 de março de 2014

Algema de sentimentos

Passou óleo, passou margarina, passou sabonete e não passava a agonia em ter aquilo em sua mão. Passou o dia e ainda não estava livre.

Ter aquela lembrança concreta era como manter uma fidelidade abstrata e unilateral.

Tudo acabou e o grilhão insistia em prendê-lo ao passado.

Engordou demais desde que comprou a aliança, que serviria para selar um compromisso.

Seu corpo engordou, sua cara engordou, seu dedo engordou, seu coração engordurou.

Talvez seu sobrepeso tenha sido o motivo para ser trocado. Agora era outro o dono dos sentimentos dela, que ele julgava ser único dono.

Por imaginar a eternidade ele esqueceu-se do presente e jamais se preocupou em tirar a jóia.

Pensava que a removeria somente para substituir por uma dourada, mas seu comodismo também evitou a troca.

Agora lutava contra a própria natureza para enfim livrar-se. Passou pela sua cabeça a ideia de arrancar o dedo para poder se libertar do fardo.

Queria tirá-la e jogá-la o mais longe possível. Arremessar para além do horizonte. Cegar qualquer visão anterior, ensurdecer seus velhos sentimentos e silenciar a gritante tristeza.

Ao conseguir retirar a infeliz, finalmente se sentiu aliviado como se removesse uma bala do corpo, mas embora se livrasse do projétil não conseguiu curar o ferimento.

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