quinta-feira, 16 de abril de 2015

Eterna companhia

Quando criança não sabia o quanto era importante para mim. Minha mãe não me ensinou, mas a vida sim. Tive que apanhar muito e aprender sozinho que não posso viver sozinho.

Nosso relacionamento foi como um rolo que você vai enrolando, enrolando, enrolando e termina em casamento.

Conhecemos juntos as cores. O amarelo, o verde e até o vermelho. Mas nossa relação é, na maioria das vezes, transparente.

Não amo, mas dependo. É uma doença. Não consigo me livrar. Faz parte de mim. Me desespero só de pensar no fim.

Na dúvida, estou sempre prevenido.

Tenho companhia no ônibus, no carro, na firma e, acima de tudo, no quarto. Com a cama fria ou quente, sempre está lá à minha espera.

Alguns estranham, pensam que utilizo para fins escusos.

Estará sempre comigo (?)!

Divórcio? Não consigo.

Parece exagero, mas acredite, não há como viver em Curitiba, tendo renite, e não carregar papel higiênico.

segunda-feira, 6 de abril de 2015

Autobiografia da timidez

Guylherme Custódio e eu nascemos juntos. No dia 16 de janeiro de 87 na janela do apartamento 26 da maternidade Nossa Senhora de Fátima às 3h45 da madrugada não se ouviu uma criança chorar. Eu não deixei ele chamar atenção de ninguém.

Depois ele foi crescendo, crescendo,crescendo,crescendo,crescendo,crescendo e crescendo.

Em uma dessas vezes em que ele crescia (em algum sentido ele nunca para de fazer isso) o malandro aprendeu a me esconder.

Ele sabe que existo e quando conta ninguém acredita. Mas ele não me renega.

Como sabe que vivo nele e que sou um perigo eminente, adotou uma postura toda espalhafatosa para me ocultar. Acabo não aparecendo atrás daquele tamanho, daquele cabelo e daquele desengonço.

Mesmo sendo um curitibano típico, ele me disfarça.

É educado com outros, sorri, cumprimenta porteiro, caixa de mercado, cobrador, faxineira e todo mundo que merece ser cumprimentado.

Só com vizinho eu ganho a disputa. Ele pega o ônibus todo dia com as mesmas pessoas e não dá nem um oi. Diz ele que faz isso por que gosta de usar o seu direito curitibano de não falar com ninguém, mas no fundo eu sei que é mais uma vitória minha.

A tática dele para me vencer é não se levar a sério. Mas um dia eu ganhei de goleada.

O seu Canuto, pai dele, era meu aliado. Se encarregava de contar a minha história e deixá-lo mais envergonhado. Como seu Canuto se foi há 10 anos, então me encarrego de contar agora:

Quando ele era pequeno eu era maior que ele. Um dia o Guylherme foi comemorar o aniversário dele lá no Mato Grosso do Sul, com os parentes paternos.

A festa foi bonita. Fiz uma coisa que faço até hoje, ao menos uma vez por ano: deixar ele sem jeito quando cantam parabéns pra você.

Mas isso não foi nada em vista do que fiz aquele dia. Ele mesmo confessou.

Voltando para Curitiba, seu Canuto perguntou o que ele tinha achado do aniversário. Tímido por falar com o próprio pai, ele reconheceu a minha glória:

- E aí? Gostou da festa?

- Eu não comi nenhum pedaço de bolo.

- Ué, e por que não?

- Você não me ofereceu...

Seu Canuto deu risada. Eu, sem nenhuma timidez, rio até hoje.